Nelson Mandela pediu há alguns anos para que na sua lápide apenas se escrevesse : "Aqui jaz um homem que fez o seu dever na Terra." A sua humildade cabe realmente numa frase gravada na última morada. Mas o seu exemplo de vida, esse, é incomensurável. Perdurará para a história muito mais tempo do que a sua lápide. Ontem morreu um homem cuja memória será eterna.
Quando o Presidente Jacob Zuma veio anunciar ao mundo a morte do herói da luta contra o apartheid logo se sucederam as homenagens e os elogios de líderes mundiais e de tanta outra gente pelo mundo fora. Todos sabem o que significou para a evolução do mundo e das sociedades. A história dos homens registará um antes e um pós-Mandela. Algo que muito poucos conseguiram até hoje.
Nascido em Mvezo numa família de 13 irmãos de etnia xhosa, o primeiro presidente negro da África do Sul morreu aos 95 anos, após longos meses de luta contra a doença. Mas na memória de todos e para a história fica o homem que em 1990 saiu da prisão onde passara 27 anos (18 dos quais na temida Robben Island) de punho erguido. Enganou-se quem viu nesse gesto um desafio ao regime que o colocara atrás as grades. O antigo líder da ala armada do ANC deixara definitivamente para trás os tempos de violência e provou que o perdão também pode ser uma arma poderosa quando se procura alcançar a paz.
Empenhado em unir uma África do Sul dividida entre a minoria branca privilegiada e a larga maioria negra discriminada durante anos por um regime racista, quando chegou ao poder em 1994, nas primeiras eleições democráticas naquela que é hoje a maior economia de África e um gigante em termos de influência diplomática, não hesitou em recorrer ao seu engenho para acabar com as divisões. Até usou o râguebi, esse desporto de elites, através do qual conseguiu pôr todo um país a torcer pela vitória dos Springboks no campeonato do mundo organizado pela África do Sul em 1995.
Cumprido um mandato, Mandela voltou a mostrar porque é um dos políticos mais admirados em todo o mundo: decidiu deixar o poder. Um gesto ainda demasiado raro em África, mas que não tirou em nada a sua influência a "Madiba", o nome tribal que os sul-africanos usam com carinho para se referir ao seu primeiro presidente negro. Respeitado de forma quase unânime e globalmente, elogiado pela forma como soube unir a África do Sul, o Nobel da Paz 1993 (partilhado com Frederik de Klerk, o último presidente do apartheid) soube também revelar grandeza na sua vida pessoal. O homem que lançou as bases do que o arcebispo anglicano Desmond Tutu chamou a Nação Arco-Íris teve a seu lado, nestes últimos tempos de doença, toda a família.
Adorado pelo povo sul-africano, Mandela era visto como o cimento que mantinha a nação unida. Com a sua morte, surgem dúvidas sobre como vai ser o futuro de uma África do Sul onde a violência racial ainda não parece ter desaparecido totalmente, mas onde o exemplo conciliador de Mandela é um argumento tão forte que poucos ousam ignorar. Por agora, é tempo de o mundo chorar um grande homem, um exemplo tremendo para a humanidade. É tempo de dizer adeus a "Madiba", de dizer adeus a Mandela, um gigante e um herói.
Fonte Diário de Notícias PT